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Mulheres nas Ditaduras do Cone Sul

texto por Deborah Lopes e Juddy Garcez Moron


Nas décadas de 1960 e 1970 todos os os países do Cone Sul - Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Paraguai (iniciado em 1954) e Uruguai - viveram um processo político semelhante, envolvendo ditaduras militares e o aparecimento de grupos de resistência. Apesar de seu caráter heterogêneo no âmbito externo, haja vista o exemplo da rivalidade das ditaduras brasileira e argentina, estas compartilharam alguns pontos em comum. Dentre eles os que mais nos chamam a atenção são: apoio dos governos brasileiro e estadunidenses e apoio das elites nacionais e das classes médias dos países (PEDRO; WOLFF, 2010).

Em um breve exercício de contextualização histórica é possível enxergarmos que o pano de fundo do surgimento dos regimes autoritários na América Latina tem início no pós-Segunda Guerra Mundial e pode ser traduzido, em termos mais tangíveis, como o desafio do estabelecimento e/ou manutenção das zonas de influência - que tiveram grande impacto no dicotômico cenário da Guerra Fria.

Dando um passo atrás, quando olhamos para a América Latina dos anos 1930 observamos os avanços do trabalho organizado enquanto ator social e político, o que, de certa forma, minou parte do poder das classes dominantes, rurais e urbanas, bem como das forças armadas. Entretanto, com o término da Segunda Grande Guerra por meio da vitória dos Aliados e a consequente expansão e legitimação do poderio estadunidense, tais grupos sentiram-se mais aptos a recuperarem o poder perdido (BETHELL; ROXBOROUGH, 1992).

O presente ensaio não irá esgotar as variantes externas e internas que sustentaram as ditaduras no poder, tampouco esgotar a análise nos demais países do Cone Sul. Tendo seu foco na Argentina, Uruguai e Chile, baseado nesta constatação, é indispensável apontar que, a partir da reflexão anterior, é possível aludirmos duas considerações: (1) os Estados Unidos (EUA) tinham motivos para se infiltrar nos governos locais - a contenção do comunismo e manutenção de sua zona de influência após a Revolução Cubana (1959); e (2) apesar das escassas iniciativas na época, estes países já se mostravam mais suscetíveis às ações da sociedade enquanto agente politizada; o que se faz verdade, em especial, com relação a grupos de esquerda e o que viria a ser os futuros movimentos de base.

Isto posto, pensando especificamente no caso brasileiro, Fico (2008) afirma que a participação estadunidense na campanha de desestabilização do governo se deu, pelo menos, desde 1962. O autor afirma, ainda, que os investimentos nesta campanha foram inúmeros desde o começo e a organização também foi executada quase que à perfeição. E se o caso brasileiro nos choca em um primeiro momento, os demais não passam longe disso. Muitos outros regimes ditatoriais contaram não somente com os recursos e fomento dos EUA, mas também com a troca de experiências e auxílio brasileiro.

O texto propõe um breve exame sobre as mulheres que resistiram aos regimes ditatoriais no Cone Sul, especificamente na Argentina, Uruguai e Chile, como também sobre os movimentos sociais e culturais que foram importantes na resistência contra um regime tão repressivo e com práticas de tortura desumanas.


  1. O Caso Argentino (1966-1973/1976-1983)

A tomada de poder na Argentina pode ser observada em dois períodos distintos: em 1966 e em 1976. Em um primeiro momento, especificamente em junho de 1966, Juan Carlos Onganía subiu ao poder após a queda do até então presidente Arturo Illia. Com a ascensão de Onganía, um forte regime repressivo foi instaurado, e, muito embora não possamos chamá-la de “militar” devido ao caráter civil que o governante possuia, é possível, sim, ler o contexto nestes termos. Este governo, que durou quatro anos, contou com uma intensa oposição popular e teve seu fim demarcado após a chegada de Roberto Levingston à presidência. Entretanto, a pressão popular só cresceu e, com a necessidade de uma troca presidencial novamente, Alejandro Lanusse subiu ao poder em 1973 (MACHADO; NÓBREGA, 2016).

O que se deu a partir de então foi um período de profunda instabilidade política. Segundo Machado e Nóbrega (2016), após Lanusse convocar novas eleições, Juan Perón assumiu a presidência em um cenário caótico, que envolveu uma série de processos. Entretanto, oito meses após sua ascensão, Perón morreu e sua vice, Maria Perón, assumiu o posto presidencial sendo destituída da presidência após um novo golpe em março de 1976. É importante ressaltar que esse novo sistema ditatorial não foi semelhante ao primeiro, distinguindo-se a partir da sua gestão: no segundo caso a coordenação era feita por uma junta militar formada por membros dos três setores das Forças Armadas e, entre 1976 e 1983 quatro juntas assumiram o poder.

Todas aquelas que já tiveram contato com a temática ditatorial no Cone Sul reconhecem que o caso argentino foi especialmente truculento. “Ao contrário de ocultar a repressão — como aconteceu no Brasil —, os militares argentinos pareciam seguros de que obteriam o apoio da sociedade à repressão.” (FICO, 2013, p. 244). Tal visibilização da violência poderia ter tido inúmeros rumos. E, de fato, diversos foram os caminhos adotados pela sociedade como um todo. Alguns grupos se organizaram de forma semelhante ao caso brasileiro, constituindo uma militância armada. Outros optaram pelo não envolvimento. Outros, ainda, como é o caso das Madres e das Abuelas de la Plaza de Mayo, adotaram uma abordagem de denúncias e manifestações públicas.

A primeira manifestação das Madres ocorreu em um domingo, no dia 30 de abril de 1977, na Praça de Maio. Essas mães se mobilizaram a fim de reclamarem seus filhos e filhas desaparecidos (DE PAULA, 2016). Embora em um primeiro momento elas não se reconhecessem como movimento político e afirmassem desejar somente uma resposta imediata sobre a localização de seus filhos, conforme o movimento foi se consolidando e se expandido muitas mães entenderam a dimensão política que suas lutas tinham (CASTELLI, 2012).

Diversas foram as técnicas utilizadas por essas mulheres e, por consequência, múltiplos foram os desdobramentos (Ver BOUSQUET, 1983; GORINI, 1983; KECK; SIKKINK, 1998). Ainda que não seja possível abordarmos todos os fatos que se sucederam a partir da manifestação destas Madres, dois pontos devem ser ressaltados: se em um primeiro momento elas lutavam por informações sobre seus filhos e filhas desaparecidos, em uma época seguinte a busca era por corpos. Afinal, muitos militantes foram, além de terem sido aprisionados e torturados, assassinados pelo Estado argentino.

Outro grupo muito importante cuja atuação está diretamente vinculada à do grupo anterior é o das Abuelas de Plaza de Mayo. Como aponta Quadrat (2003), esta organização surgiu em 1977 e adotou seu nome oficial a partir de 1980. Elas foram e são “mulheres unidas pela perda não só de filhos, mas também de netos. Encontrar o neto era/é uma forma de dar continuidade ao filho, à sua herança.” (QUADRAT, 2003, p.174).

Tal união se fez necessária, além da efetivação do Direito à verdade e à memória, pois o desaparecimento - a entender-se aqui como rapto e mesmo assassinato - de bebês e crianças filhas e filhos de militantes presos era algo comum no regime ditatorial argentino. Por meio de uma fortíssima campanha anticomunista instruções para que os militares lidassem com as filhas e filhos dos presos políticos foram dadas: crianças com até 4 anos deveriam ser entregues para orfanatos ou famílias de militares e, crianças mais velhas, especialmente aquelas por volta dos 10 anos, precisariam ser mortas. Tal diferenciação se deu pois o governo acreditava que as crianças mais novas estariam livres de uma suposta má influência de seus pais, enquanto mais velhas já estariam imersas na subversão de seus progenitores. (QUADRAT, 2003)

Ainda sobre a problemática da apropriação de crianças, ela não foi um fenômeno exclusivo da ditadura na Argentina. Como bem nos lembra Quadrat (2003), esse caso também envolveu crianças uruguaias. Uma possível explicação para esse intercâmbio de técnicas que podem ser consideradas terroristas está na Operação Condor, que foi estabelecida pelos principais serviços de inteligência dos países do Cone Sul em dezembro de 1975, e cujo objetivo foi o de “oficializar o intercâmbio de informações sobre a ‘subversão’ em seus países, bem como a realização de ações conjuntas e de treinamento militar.” (QUADRAT, 2003, p.171)

Isto posto, embora tal Plano tenha sido posto em curso e o regime ditatorial argentino tenha sido profundamente marcado pelo aprisionamento, tortura e assassinato de diversas pessoas, mulheres como as Madres e as Abuelas da Plaza de Mayo não se permitiram intimidar, sendo elas mesmos, por vezes, levadas aos centros de detenção e/ou mesmo até a morte. Como pode ser observado, portanto, apesar das diversas barreiras, as argentinas estiveram, e ainda hoje estão, sempre muito firmes na luta por Direitos Humanos e contra as derrocadas social, política, econômica, cultural e, acima de tudo, humanitária que ocorreram e ainda ocorrem nestes regimes autoritários.

  1. O Caso Uruguaio (1973-1985)


Fazendo uma breve retomada histórica, até os anos 1960 o Uruguai era chamado de “Suíça da América do Sul”, devido a sua estabilidade política, econômica e social. Muitos desses direitos que permitiram o país de ter o referido apelido foram conquistados bem antes. No início do século XX, por exemplo, as mulheres já faziam parte da vida e articulação política do país, de acordo com Graciela Sapriza (2005), a entrada crescente das mulheres na vida social uruguaia promoveu uma revolução cultural, dessa forma elas já estavam alocadas nos espaços políticos e acadêmicos e assim foram influenciadas pela segunda onda do feminismo após a década de 1960. A luta dessas mulheres foi mais observada nos anos 1980 na resistência da ditadura.

Como antecedentes do autoritarismo uruguaio podemos inferir que a partir de 1972, com a eleição do conservador Juan María Bordaberry na presidência, os movimentos de oposição, dentre eles o mais famoso, Movimiento de Liberación Nacional-Tupamaros (MLN-T), atuaram manifestando seu descontentamento com o governo e com a crescente crise econômica que assolou o país. Em razão da polarização social, em abril do mesmo ano ocorre um embate entre o MLN-T e o grupo de extrema direita Esquadrão da Morte, o qual culminou com o assassinato de onze pessoas. Por esta razão, o Parlamento declara Estado de Guerra Interna e aprova a Lei de Segurança do Estado, a qual suspendia as garantias individuais e justificava o contra-ataque aos Tupamaros orquestrados pelas Forças Armadas Uruguaias.

Bordaberry observou a crescente influência militar e decidiu nomear o General Antonio Francese para o cargo de Ministro da Defesa como uma tentativa de submeter os militares ao poder civil, entretanto, essa medida não obteve sucesso; os militares, em contrapartida, se rebelaram contra o presidente e pressionaram-o para renunciar. Bordaberry contornou a situação elaborando um acordo com os militares, -conhecido como Pacto de Boiso Lanza- o qual criou o Conselho de Segurança Nacional (Cosena) integrado pelo Presidente, os ministros e os comandantes das Forças Armadas. Desta forma, o presidente junto com os militares dissolveu o Parlamento e passaram a perseguir os opositores.

Uma observação tem que ser levantada, pois, diferente de seus vizinhos, a ditadura uruguaia sempre teve presidentes civis, apesar da forte ala militarista. Em contrapartida como ponto em comum podemos citar a utilização da Doutrina de Segurança Nacional (DSN), utilizada pelos EUA durante a Guerra Fria e difundida na América Latina pelas ditaduras militares. Neste caso, além da DSN, o catolicismo de ultradireita também foi importante para a escalada de um governo violento e autoritário.

Com o endurecimento da política de repressão, de acordo com Mariane (2016), “coube aos opositores ao sistema e aos integrantes de movimentos sociais, incluindo os grupos feministas, encontrar formas de atuação que não os expusesse de forma clara, mas que também não desarticulasse o movimento”. A militância feminina pode ser observada em diversas organizações, dentre elas destacam-se a Madres y Familiares de Uruguayos Detenidos Desaparecidos, a qual pressionaram o governo por explicações de seus familiares desaparecidos ou seu direito de saber o paradeiro deles.



Conforme nos aponta Mariane (2016) a militância feminista uruguaia teve inicialmente uma dupla atuação: lutavam pelo protagonismo e representatividade das mulheres, ao mesmo tempo em que militavam politicamente contra o regime militar com reivindicações de defesa dos direitos humanos (BORGES, 2009, p.55).

A resistência feminina foi muito importante na luta dos direitos das mulheres na ditadura e pela democracia, e além da cooperação entre ditaduras latino-americanas, podemos ressaltar a cooperação entre os movimentos de oposição ao regime ditatorial, como na ajuda da identificação das crianças e bebês, filhas e filhos dos militantes, sequestrados ilegalmente e que passaram pelo eixo Argentina-Uruguai.

  1. O Caso Chileno (1973-1990)


Nas eleições de 1970, Salvador Allende, candidato pela Unidad Popular -conglomerados de partidos de esquerda- venceu a corrida presidencial, instalando a via chilena para o socialismo. Ele acreditava que podia implementar o socialismo por meio de uma via democrática, uma vez na presidência ele dialogou com ambos os setores políticos. Entretanto, esse diálogo descontentou ambas partes: a esquerda via as mudanças

implementadas como lentas e não queriam estabelecer diálogos com os centros conservadores, por outro lado, a direita via com desconfiança o governo de Allende e suas medidas políticas.

Em 1973 Augusto Pinochet liderou um violento golpe militar no país, com a ajuda dos EUA e do Brasil. A embaixada brasileira serviu de base para os encontros e articulações entre os governos, e assim, se encerrou a experiência socialista chilena. Com a ditadura instaurada, Pinochet implementou diversas políticas rígidas, um plano econômico ortodoxo, com fortes medidas austeras, perseguições políticas e supressão de direitos sociais. Em 1980, Pinochet institucionalizou essas medidas junto com o viés neoliberal em uma constituição que vigorou até 2020. Por pressões populares iniciadas no ano anterior, o governo convocou plebiscito para elaboração de uma nova Constituição, que saiu vitoriosa. A nova Assembleia Constituinte, prevista para 2021, será composta por 155 parlamentares e como consequência direta da pressão de movimentos sociais, a composição da Assembleia terá que observar a paridade de gênero.

Ao analisarmos a ditadura chilena, movimentos sociais e grupos guerrilheiros nos chamam atenção, o mais conhecido foi o Movimiento de Izquierda Revolucionaria (MIR), no entanto, cabe ressaltar o papel das mulheres como grupo de resistência. Como nos conta Joana et al. (2010), a segunda onda feminista deu seus primeiros passos ao longo da ditadura chilena e gerou uma conscientização de gênero, a qual foi amplamente debatido dentro dos principais grupos de resistência. É importante pontuarmos o papel da Igreja Católica no caso chileno, ela muitas vezes ajudou os movimentos sociais concedendo espaço para articulação e auxílio aos familiares dos desaparecidos.

A participação da Igreja Católica, por meio do Comité de Cooperación para la Paz en Chile, é observada pela prestação de assistência legal e social às vítimas das violações aos direitos humanos, desde 1973. Como consequência dessa organização surgiu a Agrupación de Familiares de Detenidos Desaparecidos, cuja principal forma de resistência foi por meio de uma dança folclórica performatizada por mulheres (WOLFF, 2018).

Entre os anos 1970 e 1980 diversos movimentos feministas ligadas à esquerda surgiram, os quais destacamos o Movimiento pro Emancipación de la Mujer Chilena e o Mujeres por la Vida, segundo Talita (2017) “foram eles os responsáveis por reunir a maior parte das organizações sociais femininas de oposição e ainda ampliaram o amplo aspecto político opositor, partidário, independente e feminista”. No ano de 1983 ocorreu o ato pró-emancipação feminina no teatro Caupolicán, foi o primeiro de muitos atos de resistência das mulheres na ditadura chilena, outro que foi importante para o contexto chileno foi a marcha do “Somos mas” realizada em 1985, cujo objetivo era alertar a violência que estava sendo neutralizada pela ditadura chilena. A marcha foi realizada em um bairro de Santiago onde as mulheres se concentraram e saíram todas juntas marchando silenciosamente exigindo a liberdade dos dirigentes sociais detidos (SANTOS, 2017).

Em 1987, o movimento feminista divulgou o documento Demandas de las Mujeres a la Democracia, no qual continha exigências específicas que reparassem a desigualdade estrutural entre homens e mulheres legalmente (SANTOS, 2017). Outro marco muito emblemático da resistência feminina foi a elaboração do Pliego de las Mujeres, também de cunho emancipatório, que marchou contra a ditadura e principalmente pela busca dos direitos das mulheres, segundo Talita (2017):


“(...) a crítica ao governo militar implantada no Pliego era tão intensa que nos meses finais de 1986, onde o endurecimento da repressão era intensificado, os oficiais da tropa do general Pinochet lançam uma resposta à Asemblea de la Civilidad de la Mujer, onde acusam os membros da assembleia de atentar contra a segurança interior do Estado por meio do conteúdo do Pliego.” (p.29. Grifos próprios)


Em resposta aos oficiais de Pinochet, o grupo convocou mais uma vez as mulheres para irem às ruas, agora sob o lema “iNo mas ditadura!”, o objetivo principal da marcha foi promover o retorno da democracia.

Talita (2017) continua, afirmando que


“essa politização feminina, diante do contexto repressivo que o Chile vivia, representou uma grave ameaça aos valores sociais no qual a mulher estava submetida. A ditadura chilena castigou aquelas mulheres que procuraram romper com o sistema patriarcal no país por meio da sua mobilização, que subvertiam os valores estabelecidos, nos quais não atribuíam a figura feminina espaço para a participação política, ficando essas mulheres submetidas a uma violência sistemática que castigava sua atuação nos movimentos contra o governo e outros tipos de mobilização.” (p.34)


Apesar da violenta repressão que a ditadura chilena impôs aos seus cidadãos e cidadãs, não podemos ignorar suas lutas, sobretudo, das mulheres que foram primordiais para o retorno democrático do país, mesmo que em condições que não agradaram a população chilena. A democratização foi por via de negociação, a qual Pinochet recebeu o cargo de senador vitalício e apenas em 2003 que o então presidente Ricardo Lagos instaurou a Comissão Nacional sobre Prisão e Tortura para investigar os mortos, desaparecidos e os agentes causadores.

Em suma, podemos concluir que as ditaduras cooperaram entre si, sobretudo a ditadura brasileira, por meio da Operação Condor, esse contando também com a interferência estadunidense, e pela difusão das técnicas de tortura.

A tortura foi elemento central utilizado pelas ditaduras latino-americanas, sobretudo, nas mulheres. Essas mulheres latinas sofreram violência sexual, todo tipo de assédio sexual, animais inseridos em seus órgãos genitais e todo tipo de humilhação possível. Sabemos que o gênero é utilizado como arma de guerra e, em um contexto de Guerra Fria e no imaginário da contenção comunista, foi utilizado em demasiado. A violação de corpos femininos como arma para obtenção de informações de terceiros também foi bastante difundida, como exemplo bastante citado nos relatórios das Comissões da Verdade, os militares obrigavam outros militantes presos a estuprarem as mulheres presas.

Para concluir, sabemos que as ditaduras civis militares da América do Sul foram bastante repressivas, perseguiam, torturavam e matavam qualquer tipo de opositores ao regime. Até hoje o número de desaparecidos, torturados, presos políticos e no caso argentino e uruguaio de crianças sequestradas, não é certo. Entretanto, olhar com mais cautela e com as lentes feministas para a resistência das mulheres é de suma importância, tendo em vista que, foram por meio delas que os movimentos guerrilheiros se sustentaram, seja fazendo comida, seja levando mensagem, seja na luta, assim como foi importante para o processo de redemocratização e na garantia de seus direitos.


Referências bibliográficas


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