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Desafios na busca por uma educação de qualidade: o caso do Paquistão e do Chade

Beatriz Furlan

Naomi Napuri


O presente artigo irá discutir, de uma forma geral, a relação entre a alfabetização e o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável nº4, o qual, em suma, caracteriza-se pela busca por uma educação de qualidade. Ademais, tendo em vista o objetivo do Núcleo de Pesquisa, tal texto ainda abordará a situação das mulheres nesse contexto. Nesse sentido, dois países serão analisados: o Paquistão e o Chade. Assim, esse trabalho pretende demonstrar o desenvolvimento da Agenda 2030 e como as ações dos países estão, de fato, impactando suas nações e, principalmente, as mulheres. Para isso, o artigo é dividido de tal forma que há uma contextualização sobre a alfabetização e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, um panorama geral sobre o Paquistão e, posteriormente, sobre o Chade, e, por fim, uma conclusão.


Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)

Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável são uma parceria entre a ONU e os seus países-membros em que ações são promovidas para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas possam desfrutar de paz e de prosperidade. Ao todo, são 17 objetivos, os quais variam entre erradicação da pobreza, saúde e bem-estar, água potável e saneamento, entre outros. O seguinte artigo abordará com um maior aprofundamento a ODS 4, que discorre sobre educação de qualidade (NAÇÕES UNIDAS; s.d.a).

Nesse sentido, a quarta ODS busca, de acordo com o site da ONU: “garantir o acesso à educação inclusiva, de qualidade e equitativa, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos” (NAÇÕES UNIDAS; s.d.b). Ademais, o ponto 4.1 fala especificamente sobre proporcionar que todos os meninos e meninas acessem de forma equitativa e de qualidade o ensino primário e secundário, a fim de que eles possam entrar em contato com assuntos relevantes e eficazes. Somado a isso, tem-se o ponto 4.c, o qual discorre sobre a necessidade de aumentar o contingente de professores qualificados nos países em desenvolvimento, principalmente os menos desenvolvidos e os pequenos Estados insulares, por meio da cooperação internacional (NAÇÕES UNIDAS; s.d.b).


A alfabetização e a ODS 4 no Paquistão

O sistema de ensino no Paquistão é supervisionado pelo Ministério da Educação, enquanto o desenvolvimento curricular, o crédito e o financiamento de pesquisa e desenvolvimento são feitos pelo governo federal. Além disso, o Estado é obrigado a oferecer uma educação de qualidade gratuita e obrigatória para crianças entre os cinco e os dezesseis anos de idade (KHAN; 2020). Ainda que tais fatores sejam constitucionais, o Paquistão tem 6,7 milhões de mulheres entre quinze e vinte e quatro anos analfabetas, ou seja, apenas 42% da população feminina sabem ler e escrever, enquanto 67% dos homens são alfabetizados (EDUCAÇÃO INTEGRAL; 2015).

Ademais, de acordo com estudos de 2006, as taxas de matrícula de meninas paquistanesas na escola primária estão entre as 10 mais baixas do mundo, enquanto as taxas de evasão escolar são maiores que as dos meninos, o que tem como consequência uma disparidade de gênero maior no nível secundário. Em termos geográficos, a alfabetização em áreas urbanas é maior do que em áreas rurais. Esse cenário precário na educação piorou com a expansão do Talibã no Paquistão. Isso porque esse grupo é contra a educação feminina, tendo em vista que argumentam que o conhecimento educacional não deve ser expandido para as mulheres, dado que elas são responsáveis por atividades domésticas. Somado a isso, o Talibã também argumenta que a educação moderna traz a consciência dos direitos femininos, como trabalho, opção sexual, entre outros, os quais não são bem vistos por esse grupo (KHAN; 2020).

Esse preconceito é tão forte que mais de 860 escolas foram atacadas entre 2007 e 2015. Dentre as motivações dos ataques estão o ensino científico e a aceitação de meninas. Dados apontam que durante o governo do Talibã, houve a destruição de 401 escolas, sendo 70% delas femininas, o que demonstra uma taxa desproporcional de ataques em relação a escolas masculinas. Uma figura muito importante na luta contra esse movimento é a ativista paquistanesa Malala Yousafzai, responsável por discursar sobre a violência de gênero diária em seu país e por lutar pelos direitos ao acesso à educação para as mulheres (KHAN; 2020).

Em relação aos motivos para esse preconceito se perpetuar, um se destaca: os estereótipos de gênero em materiais de ensino e aprendizagem. Isso significa que o papel das mulheres nesses livros destinados ao ensino secundário é retratado em papéis tradicionais, isto é, em papéis passivos, dependentes e domésticos. Essa representação é problemática na medida em que, para algumas pessoas, esses livros didáticos são os únicos livros que elas terão acesso. Logo, é necessário que a revisão dos livros didáticos inclua igualmente as mulheres, dado que eles são ferramentas importantes para a promoção dos direitos das mulheres (UNESCO; 2020).

Por fim, é válido ressaltar que algumas medidas estão sendo aplicadas para tentar resolver esses problemas. Uma delas é o programa escolas A Right to Play, o qual busca empoderar os estudantes por meio de esportes e videogames a fim de reduzir a violência nas escolas e impactar as disparidades de gênero. Dados mostram que, em 2018, o programa alcançou 8.000 crianças em 40 escolas públicas, o que teve como consequência a queda em 33% entre meninos e 59% entre meninas na vitimização. Ademais, os sintomas de depressão caíram entre meninas e meninos em cerca de, respectivamente, 10% e 7% (UNESCO; 2020).

A alfabetização e a ODS 4 no Chade

O panorama educacional do Chade é notoriamente caracterizado por um nível de ensino inadequado, com apenas uma em cada duas crianças em idade de alfabetização frequentando a escola. Não obstante a clara priorização da melhoria da educação no país, é inegável que o Chade continua a enfrentar desafios persistentes que afetam adversamente a qualidade de sua educação (UNICEF; 2023).

Os desafios que assolam o setor educacional são multifacetados, abrangendo desde a carência de docentes e infraestrutura até as complexas ramificações da crise migratória que afeta as nações vizinhas. Além disso, o setor enfrenta dificuldades financeiras, impactando de forma especialmente severa as áreas rurais, onde os recursos são escassos. Esses problemas são exacerbados pelas crises humanitárias em países limítrofes, resultando em um significativo influxo de refugiados em território chadiano. As questões internas, como a instabilidade na região do lago, agravam ainda mais a situação, levando a um elevado número de deslocamentos internos de crianças (GLOBAL PARTNERSHIP; 2023).

Um fator agravante adicional é a carência de docentes qualificados para exercerem a profissão. O sistema educacional chadiano engloba três categorias de professores: servidores civis, professores de comunidades treinados e professores de comunidades não treinados. É importante observar que o nível acadêmico dos docentes no país tende a ser precário, com apenas 3 entre 4 estudantes tendo acesso a professores cuja formação se restringe ao ensino fundamental (UNICEF; 2023). Isso ressalta a relevância dos professores não treinados para a melhoria da educação no país, visto que sua ausência exacerba ainda mais os problemas educacionais.

Para enfrentar esses desafios, o governo chadiano implementou duas medidas significativas em todo o país. Dada a existência de duas línguas oficiais no Chade (Francês e Árabe), foi adotada uma política de ensino bilíngue na educação básica, visando abranger um público mais amplo, independentemente de sua língua materna (GLOBAL PARTNERSHIP; 2023). Além disso, como estratégia para lidar com os problemas decorrentes do fluxo migratório, todas as escolas em campos de refugiados foram integradas ao sistema educacional nacional, alinhando suas grades curriculares com as escolas do país. Esse ajuste facilita a transição de crianças e jovens do sistema educacional em campos de refugiados para o sistema nacional após sua saída desses locais.

Portanto, é evidente que o governo chadiano reconhece a necessidade premente de reestruturar e aprimorar seu sistema educacional como um passo fundamental para o desenvolvimento sustentável do país. Nesse esforço, o Chade conta com o apoio de diversas organizações, sendo a Global Partnership Education uma das principais colaboradoras desde 2012, contribuindo com mais de 142 milhões de dólares para impulsionar o acesso à educação, especialmente para as meninas, e capacitar o sistema educacional (GLOBAL PARTNERSHIP; 2023). Organizações das Nações Unidas, como a UNICEF e a UNESCO, também são doadoras recorrentes em prol da educação, como evidenciado por uma recente doação no valor de 10 milhões de dólares para os anos 2023-2025, embora até a presente data não tenha sido divulgada a alocação específica desses fundos (GLOBAL PARTNERSHIP; 2023).

Em suma, a qualidade do sistema educacional de um país desempenha um papel crucial no forjamento de seu futuro próspero, e o Chade deve implementar medidas eficazes para aprimorar a educação e garantir o desenvolvimento sustentável da nação.


Conclusão

Em síntese, a análise das situações educacionais no Paquistão e no Chade evidencia diferentes desafios que impactam a realização do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 4, que busca promover uma educação de qualidade acessível a todos.

No Paquistão, as desigualdades de gênero na alfabetização e o ataque à educação feminina pelo Talibã ilustram uma luta persistente pela igualdade no acesso à educação. Além disso, estereótipos de gênero em materiais de ensino ainda perpetuam normas tradicionais prejudiciais. Já no Chade, os obstáculos educacionais abrangem a falta de infraestrutura, escassez de professores qualificados e impactos das crises migratórias regionais. O governo chadiano demonstra esforços em abordar essas questões, incluindo a implementação de políticas bilíngues e a integração de escolas em campos de refugiados ao sistema educacional nacional.

Em ambos os casos, fica claro que a qualidade do sistema educacional desempenha um papel central no desenvolvimento sustentável de uma nação. A promoção da igualdade de gênero e o acesso equitativo à educação são desafios fundamentais a serem superados para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Pois a busca por uma educação de qualidade não apenas beneficia as gerações presentes, mas também desempenha um papel fundamental na construção de sociedades mais prósperas e igualitárias no futuro.


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Referências Bibliográficas

EDUCAÇÃO INTEGRAL. No Paquistão, a luta pelo direito à educação de meninas. Disponível em: https://educacaointegral.org.br/reportagens/paquistao-luta-pelo-direito-a-educacao-de-meninas/#:~:text=Como%20reflexo%20do%20baixo%20acesso,a%20taxa%20cai%20para%2042%25.. Acesso em: 19 set 2023


GLOBAL PARTNERSHIP. Chad. 2023. Disponível em globalpartnership.org/where-we-work/chad. Acesso em 20 set. 2023


KHAN, Sabir. Sistema de Educação Feminino no Paquistão antes e pós Regime do Talibã . 2020. Tese (Doutorado) - Curso de Educação Escolar , UNESP , Araraquara , 2020. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/202499/khan_s_dr_arafcl.pdf?sequence=3&isAllowed=y. Acesso em: 19 set. 2023.


NAÇÕES UNIDAS. Como as Nações Unidas apoiam os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável no Brasil. s.d.a. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/sdgs. Acesso em: 19. set 2023.


NAÇÕES UNIDAS. Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 4 - Educação de qualidade. s.d.b. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/sdgs/4. Acesso em: 19 set 2023.


UNESCO. 2020. Relatório de Monitoramento Global da Educação 2020: Uma nova geração: 25 anos de esforços pela igualdade de gênero na educação. Paris, UNESCO.


UNICEF. Education, 2023. Disponível em unicef.org/chad/education. Acesso em 20 set. 2023.




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